Psicologia
Psicologia e "cura" de homosexuais
Saiu no site da revista Época semana passada que "um estudo com 1400 psiquiatras e terapeutas publicado pela revista especializada BMC Psychiatry concluiu que um em cada seis profissionais admite ter tratado pelo menos um paciente para alterar os seus sentimentos homossexuais, mesmo sabendo que a prática é condenada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). De acordo com o estudo, as entidades religiosas são as que mais estimulam a crença de que a homossexualidade pode ter "cura". Em um artigo publicado no jornal britânico The Independent, o professor Michael King, da Universidade College Medical School, em Londres, afirma que os jovens encontram esse tipo de promessa principalmente na internet e depois levam a questão para seus terapeutas. 'Se o terapeuta não tem bom senso o suficiente para dizer que o desejo homossexual é uma parte deles e não há nada patológico nisso, os pacientes podem ser seduzidos a tentar a reversão', afirma King". A reportagem completa pode ser lida aqui.
Não sou gay, mas também não concordo de maneira nenhuma - enquanto profissional dos direitos humanos - com esse tipo de prática discriminatória (sim, discriminatória, pois se eu parto do pressuposto que a heterossexualidade é o normal e busco "converter" os diferentes tendo em vista o meu referencial, estou negando que outras normalidades e realidades, para além da minha, sejam possÃveis). O problema é que muitos psicólogos confundem psicologia com religião e acabam levando alguns princÃpios religiosos - que deveriam permanecer na esfera privada - para a prática profissional. Aà parece estar o cerne de grande parte das condutas profissionais equivocadas na psicologia. O ponto-chave é que da mesma forma que não parece possÃvel - nem desejável - reverter a homossexualidade, parece muito difÃcil "desligar o botão" da religião (como na metáfora da foto acima) e ligar o da psicologia, sem que a primeira influencie, de alguma forma, a última. Penso que para ser um profissional minimamente ético e empático, o psicólogo deve ficar muito atento e crÃtico à forma como suas crenças - em especial as religiosas, por serem muito fortes e arraigadas - influenciam sua prática, especialmente a clÃnica. O psicólogo não precisa ser ateu como eu (e que fique claro: não tenho nenhuma pretenção, como Richard Dawkins, de converter ninguém à minha descrença), mas ele deve - e uma terapia pessoal pode ajudar muito - estar bastante consciente de suas crenças para não tentar (consciente ou inconscientemente) converter seus pacientes à s suas verdades. Este é um dos pilares da psicoterapia e é o que mais nos diferencia de outras práticas ditas terapêuticas.
OBS: Em março desde ano completou 10 anos da publicação da Resolução CFP n°001/1999, que, dentre outros apontamentos, proibe a atuação dos psicólogos na "cura" de homossexuais e que representou um gigantesco avanço na luta contra a homofobia e o preconceito de uma forma geral.
Update (23/04/09): Nos comentários à reportágem da revista Época li relatos tocantes. O que mais me chamou atenção foi o seguinte, intitulado "Sou gay e sou feliz": No dia 30 de dezembro de 1993, entrei no consultório de uma psicóloga, revelando que era homossexual. Ela disse que ia me ajudar a superar este “problema†e que ainda iria me ver se casando na igreja com uma mulher, pois, segundo ela, já havia “tratado†um rapaz que era gay, mas que havia se tornado heterossexual e ainda fora madrinha do casamento dele. Eu não tinha a menor consciência de nada e, pelo fato de não ter com quem conversar, inclusive não podia revelar em casa que fazia terapia porque meus pais não iriam aceitar, concordei com o que ela disse numa boa. E mais, confesso que fiquei bastante aliviado, pois, no meu modo de ver, iria, definitivamente, conseguir me livrar da angústia de ser homossexual. No entanto, a terapia não evoluiu e eu sofria cada vez mais. Até que uma colega de trabalho me contou que seu namorado era psicólogo.Larguei a antiga psicóloga e passei a ter o namorado de minha amiga como novo terapeuta. Desde então, minha vida se transformou. O tratamento dele comigo foi outro. Aceitei minha homossexualidade, parei de chorar, parei de sofrer, aprendi a conviver com o fato de ser gay, apesar do gigantesco sacrifÃcio, mas hoje sou um cara bem resolvido e feliz. O problema hoje é externo, ou seja, o preconceito da sociedade machista, mas, na vida, ser feliz não quer dizer não ter problemas, mas, sim, saber lidar com os problemas com calma e lucidez. Meu psicólogo sempre me respeitou. Eu era afeminado e até isto percebi que não precisava ser, pois, para ser gay, não precisa, necessariamente, parecer mulher, embora eu tenha amigos assim e eu os adoro. Ter um bom psicólogo e ter a vontade de superar problemas emocionais ajudam a transformar uma vida. Sou gay e sou feliz. Outros comentários e relatos podem ser lidos aqui.
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