Esta semana conversei um pouco com o professor Marcelo Afonso Ribeiro, do departamento de Psicologia Social e do Trabalho da USP, sobre a carreira do psicólogo. Bom, acabamos falando de outras coisas também, como a representação social da psicologia. Confira!
CientÃficaMente – Professor, você acha que as pessoas, em geral, sabem o que é a psicologia?
De alguma maneira, quem não tem acesso via escola, via educação a alguma área do saber, acaba tendo contato pela mÃdia impressa e televisiva. Há muitos profissionais que vão à mÃdia e falam em nome da área, alguns com propriedade, outros não. Alguns nem mesmo são da área e as pessoas os identificam como se fossem. Como exemplos temos aqueles programas de auditório cujos apresentadores não são psicólogos, no entanto as pessoas acham que são. Eles inclusive fazem interpretações ao vivo, que são duvidosas. Então as pessoas vão construindo uma representação social do que é o psicólogo a partir disso, daà acontecem muitas misturas. Eu acho que o que mais forma o senso comum é a mÃdia. Em muitas revistas há seções sobre comportamento em que supostos profissionais dão a sua opinião quando não teriam condição de fazê-lo.
Eu acho que a psicologia deveria - na verdade o Conselho Federal (CFP) há alguns anos tenta fazer isso - freqüentar mais a mÃdia só que com qualidade, com rigor, até de forma institucional, explicitando o que é a psicologia. Esse espaço está sendo conquistado aos poucos, por exemplo, o CFP teve, por algum tempo, um espaço no canal Futura. Contudo, eu fico pensando, quem é que tem acesso a um canal de TV paga? É restrito a pessoas que provavelmente já têm outra visão da psicologia. Acho que deveria haver um espaço para mostrar o que é a psicologia, explicitando aquilo que parece estar formando a opinião das pessoas. Não sei exatamente como, porque é uma tarefa difÃcil.
Essas áreas já são instituÃdas, mas hoje se abriram mais possibilidades. Ãreas em que nem se pensava que o psicólogo poderia contribuir, como na polÃtica, na gestão, em instituições, em comunidades, no trânsito, com engenheiros, enfim tudo que envolva impactos no comportamento humano cabe também ao psicólogo. O problema é que, por exemplo, pensando em alguém que está em formação, você acaba tendo contato com as áreas mais tradicionais, e tem outras áreas que você vai constituindo seu espaço. Isso é algo bom, porque agora você pode chegar e dizer que tem um conhecimento, que pode contribuir. Você pode construir um espaço, apesar de que leva um tempo para isso ocorrer. O risco é as pessoas não te reconhecerem como psicólogo, dão outro nome, fica como outra coisa. Estamos nessa abertura de novos campos de trabalho, mas que ainda não estão consolidados como tal. Alguns já estão, como a psicologia jurÃdica, a psicologia do esporte, a psicologia hospitalar, que há dez, quinze anos ninguém saberia dizer o que eram. Também podemos aproveitar áreas que estão consolidadas em outros paÃses. Hoje há mais abertura, por outro lado isso deixa as pessoas sem referências, mais confusas com relação ao que o psicólogo é e faz.
Eu acho que é o olhar. Nós desenvolvemos um olhar que é muito especÃfico. O curso - teoricamente, não que todos tenham isso - te dá uma chave de leitura da realidade muito particular (chamo de realidade as pessoas, as instituições, as organizações, dimensões da vida). Isso nos ajuda a entender para além da superfÃcie. Acho que a maioria das profissões não vai para além da superfÃcie, até porque não se propõem a isso. As nossas grandes ferramentas são o diagnóstico, em um sentido mais amplo, pensado em termos de leituras, interpretação, análise da realidade, e a forma como se acessa essa realidade. A entrevista, por exemplo, é um instrumento fantástico que nós temos, e nós extraÃmos coisas dessa entrevista que outros profissionais não extraem. É uma leitura muito particular da realidade, que consegue entender um pouco as pessoas, as relações das pessoas, e ajudar no que estabelece o cotidiano de todas as outras profissões.
Eu acho que tem que conversar muito com os professores, e também com os colegas. Às vezes o colega que senta a seu lado está fazendo um estágio muito legal, em algo que você nem imaginava. Principalmente conversar com os professores, porque à s vezes ele dá uma aula que tem que dar, mas a experiência dele é outra. Uma coisa que não se faz, eu como aluno não fazia e não vejo meus alunos fazendo, é conhecer um pouco o professor. Ver o que ele faz, o que ele pesquisa, o que ele estuda, onde ele trabalhou, o que já fez... Saber a história de vida dele é interessante, até porque ele pode te dar dicas de por onde ir, como caminhar. É importante conversar com vários, não com um só. Hoje em dia temos a Internet, mas nem sempre você sabe se a informação é válida. É legal ter alguém como uma referência, que te ajude nesse caminho. Eu ainda acho que a graduação é um espaço de exploração e de experimentação. Esse é o objetivo. Quanto mais se explorar e se utilizar do material fÃsico e humano da universidade, melhor. Não que isso vá garantir que quando você se forme terá uma inserção perfeita no mercado de trabalho. No entanto, quanto mais informação, mais fácil você consegue. Claro que há também outros fatores, como caracterÃsticas pessoais, contingências do momento, da área que você escolheu. Tem áreas que a inserção é fácil, e em outras você terá que inventar e batalhar para abrir seu espaço.