Confundir terapia cognitiva com psicologia cognitiva é comum. Apesar de terem algumas semelhanças, elas não são sinônimas.
A terapia cognitiva (TC) foi desenvolvida por Aaron Beck no inÃcio da década de 60, na Universidade da Pensilvânia, EUA. Nessa época, Beck tinha como objetivo investigar os mecanismos inconscientes propostos pela psicanálise para explicação da depressão a partir de estudos empÃricos e observações clÃnicas sistemáticas. Os resultados de suas investigações não se mostraram compatÃveis com as pressuposições psicanalÃticas, levando-o a buscar outros construtos que explicassem mais satisfatoriamente os dados empÃricos observados.
Sua preocupação era oferecer um modelo abrangente do funcionamento cognitivo (inicialmente de depressivos), que apresentasse coerência interna e compatibilidade com as observações clÃnicas, possibilitando que novas intervenções psicoterápicas pudessem ser desenvolvidas.
A terapia de Beck foi então concebida como uma psicoterapia breve, estruturada, orientada para o presente, direcionada para a resolução de problemas atuais e para modificar comportamentos disfuncionais. Desde então, Beck e seus seguidores vêm adaptando com sucesso essa terapia para um conjunto surpreendentemente diverso de populações e desordens psiquiátricas, como depressão, fobias, transtorno obsessivo-compulsivo etc.
Logo depois houve uma junção com pressupostos da terapia comportamental, e daà nasceu a terapia cognitivo-comportamental (TCC). Ultimamente esse termo acaba abrangendo muitas formas de terapia, algumas com enfoque mais cognitivista, outras mais comportamentalistas, porém em geral todas buscam mudanças adaptativas e a avaliação de resultados da terapia é fundamental.
A TCC se baseia no modelo mediacional, ou seja, uma mudança cognitiva media ou leva a uma mudança comportamental. Assim, sentimentos, pensamentos e comportamentos são inter-relacionados, isto é, eles influenciam uns aos outros. Os pacientes são ensinados a reconhecer os padrões afetivos, cognitivos (crenças) e comportamentais que pioram os seus sintomas. Uma vez que o padrão seja reconhecido, técnicas da TCC podem ser usadas para "quebrar o ciclo" por meio de modificação de respostas cognitivas ou comportamentais.
Apesar de ser contemporânea ao desenvolvimento da terapia cognitiva, a psicologia cognitiva teve outra trajetória. Seu surgimento se insere num movimento mais amplo, o das chamadas “ciências cognitivas†e pode ser circunscrito a um perÃodo particularmente fecundo que vai de 1955 até inicio dos anos 60, que envolve a chamada “revolução cognitivaâ€, com seu caráter eminentemente interdisciplinar e como “a nova retomada por parte da ciência, das questões filosóficas mais antigas acerca da mente humana, sua natureza, as relações que ela mantêm com o organismo (o cérebro), com outrem e com o mundo.â€
Alguns dos fatores desencadeantes do movimento cognitivista foram, por um lado, o fracasso do behaviorismo em explicar os aspectos mais elevados do comportamento humano a partir do paradigma estÃmulo-resposta e, por outro, pesquisas que reintroduziram no repertório da pesquisa psicológica os termos “mentalistasâ€, banidos pelo rigor artificial do behaviorismo. Somam-se a isso os trabalhos de Chomsky sobre a linguagem e principalmente o surgimento da modelagem computacional da mente, que só foi possÃvel graças ao movimento cibernético e ao advento da Inteligência Artificial.
Em termos de metodologia de pesquisa, os avanços nas pesquisas em pacientes com lesão cerebral, a retomada do tempo de reação na medida dos processos mentais, e, no campo da epistemologia, as mudanças paradigmáticas levaram alguns cientistas de renome a se unirem em torno desse novo paradigma para a investigação dos fenômenos mentais. O estudo dos processos cognitivos da perspectiva do processamento da informação tem, então, caracterizado a psicologia cognitiva nos últimos 50 anos.
Embora esse novo movimento tenha surgido numa tentativa interdisciplinar de estudar a mente, é preciso lembrar que o enfoque dos eventos mentais foi dado sob a ótica da metodologia experimental em psicologia, que recebeu grande contribuição dos psicólogos que levaram adiante o objetivo de estudar o homem como um processador de informações.
Considerado, então, um arcabouço, uma espécie de “guia†para as pesquisas em psicologia cognitiva, o processamento da informação se constitui numa maneira de focalizar os aspectos mentais, mas de forma alguma é a única maneira. Algumas áreas de pesquisa da psicologia cognitiva são: área ligada à representação da informação na memória, incluindo imagem e memória semântica, bem como a representação do conhecimento lingüÃstico; área ligada aos modelos de memória estruturados temporalmente, recuperação da informação na memória e nÃveis de processamento; área ligada à atenção e processamento perceptivo e área ligada à pesquisa em psicolingüÃstica.
Assim, historicamente, houve desenvolvimentos praticamente independentes da TC, por um lado, e da psicologia cognitiva, por outro – muito embora houvesse plena compatibilidade entre conhecimentos construÃdos em cada um desses dois âmbitos.Em diversos momentos, foi apontada uma carência de integração entre o campo da pesquisa básica (ou seja, pesquisas que visam a construir conhecimentos sobre um objeto de estudo especÃfico, sem quaisquer comprometimentos com áreas aplicadas) e a psicoterapia. Na área da TC são realizadas pesquisas mais voltadas para a prática psicoterápica, enquanto na psicologia cognitiva busca-se estudar a cognição humana em geral, sem compromisso com terapia.
Atualmente, existe um movimento de integração entre psicologia cognitiva e TC, em que se buscam unificar, na prática psicoterápica, refinamentos em termos explicativos acerca do funcionamento cognitivo nos mais diversos transtornos psiquiátricos. Tais sofisticações teóricas - construÃdas usualmente a partir de pesquisas experimentais - apresentam implicações no que tange a estratégias de intervenção, revelando um importante ganho que se obtém quando há uma prática de psicoterapia com sólidos fundamentos empÃricos.
Referências
Juruenal, M.F. (2001). Terapia cognitiva: abordagem para o transtorno afetivo bipolar. Rev. Psic. ClÃn. 28(6), 322-330.
Pergher, G.K.; Stein, L.M.; Wainer, R. (XXXX). Estudos sobre a memória na depressão: abordagem para o transtorno afeitvo bipolar. Revista de Psiquiatria ClÃnica.
Rodrigues, C.M.L.; Lopes, E.J. (XXXX) A Psicologia cogntiva no Brasil: um panorama dos anos 90.