A Pré-história da Psicanálise II - O aparelho psíquico
Psicologia

A Pré-história da Psicanálise II - O aparelho psíquico


Psiquismo: “aparelho” capaz de transmitir e de transformar uma energia determinada.
O funcionamento é explicado a partir de duas hipóteses:
1. Que existe uma quantidade(Q) que distingue a atividade de repouso das partículas materiais.
2. A identificação dessas partículas materiais com os neurônios*.
Princípio da inércia neurônica: Os neurônios tendem a descarregar toda quantidade (Q) que recebem.
“Freud afirma ainda outro principio, segundo o qual o sistema de neurônios se estrutura de tal modo que forma ‘barreiras de contato’ que oferecem resistência a descarga total” (pág. 46).

A noção de quantidade

Freud refere-se a dois tipos de (Q):

Q: refere-se à quantidade de excitação ligada à estimulação sensorial externa.
Q’n: é de ordem interna, intercelular.

“Portanto, Q’n é psíquica, enquanto Q indica uma quantidade externa” (pág.47).

Freud partindo da análise dos casos de histeria e neurose obsessiva levanta a hipótese de que haveria uma proporcionalidade entre as intensidades dos traumas e intensidades dos sintomas por eles produzidos.

O principio de inércia


Segundo esse princípio os neurônios tendem a se desfazer de Q, essa descarga representa a função primordial do sistema nervoso, ela soma-se a uma outra função secundária segundo a qual o sistema neurônico procura não apenas livrar-se de Q, mas conservar aquelas vias de escoamento que possibilitam manter-se afastado das fontes de excitação. “Além da função de descarga, há também a fuga do estímulo” (pág. 49). Mas o principio da inércia não atua sozinho, ele é entravado por outro modo de funcionamento do aparelho psíquico, cuja característica é evitar o livre escoamento de energia, isso ocorre por que o sistema nervoso recebe tanto estímulos originários do exterior, quanto do próprio organismo, os estímulos externos podem ser evitados, mas os internos não oferecem possibilidade de fuga, eles criam as grandes necessidades como a fome, a respiração e a sexualidade, eles só desaparecem após a realização da ação que possibilita a eliminação do estímulo.

Se o SN descarregasse toda a quantidade de energia que fosse investido, ele não teria energia para realizar ações destinadas a satisfazer exigências dos estímulos endógenos. “Como essa tendência se opõe a tendência inicial à inércia (que implicaria reduzir Q a zero), o sistema neurônico procura manter essa quota de Q num nível mais baixo possível ao mesmo tempo que procura se proteger contra qualquer aumento da mesma, isto é, procura mantê-la constante. Esta é a lei da constancia”(pág. 49).

Os neurônios : (fi) , (psi) e (omega)

Existem duas tendências básicas do sistema neurônico:
1. Uma que impele a descarga total de Q
2. E outra que o obriga a armazenar e investir uma certa quantidade destinada a reduzir as tensões decorrentes dos estímulos internos.

A segunda tendência é possibilitada pelas barreiras de contato que são resistências localizadas nos pontos de contato entre os neurônios, impedindo a passagem da energia que deveria ser escoada.
Os neurônios que deixam passar Q como se não tivessem barreiras de contato, sendo permeáveis, são os neurônios fi, destinados a percepção; os que opõem uma resistência ao livre escoamento de Q através das barreiras de contato, sendo que depois de cada excitação, ficam diferentes do que eram anteriormente, constituindo uma memória, são os neurônios psi.(neurônios impermeáveis).
A impermeabilidade do neurônio psi não é total, parte de Q fica retida pelas barreiras de contato a parte consegue ser escoada, aqui Freud elabora a noção de facilitação, pois quando há uma passagem parcial de Q pelas barreiras de contato, essas barreiras ficam marcadas, diminuindo a resistência de tal modo que daí por diante a excitação tende a percorrer o mesmo caminho através do qual houve uma facilitação, o grau de facilitação depende da maior ou menor quantidade (Q) com a qual o neurônio tem de se defrontar.
Essa diferença entre os neurônios fi e psi pode ser devida à posição que eles ocupam em face da fonte de excitação, os neurônios fi são alimentados de fonte externa, portanto a carga Q se encontra em volume maior não permitindo a criação de barreiras de contato, pois seriam destruídos pelo excesso de Q.
Os neurônios psi são estimulados por fonte endógena, por serem menos carregados podem formar barreiras mais ou menos fortes, constituindo uma memória.

A função primordial dos dois sistemas de neurônios é manter afastadas grandes Qs externas através da descarga. “Se o desprazer é identificado com a tensão decorrente do acúmulo de Q, o prazer consiste na descarga dessa Q excessiva. O prazer é a própria sensação de descarga, sendo que qualquer manutenção de Q no sistema nervoso é apenas tolerada”(pág. 51)

* “os ‘neurônios’- as partículas materiais que compõem esse aparelho-não correspondem aos dados da histologia e da neurologia de sua época[...]essa neurologia e a ‘anatomia’ que ele nos apresenta são fantásticas”(pág.47).

Segundo Caropreso e Simanke (2005) “A natureza dessa quantidade não é especificada. Há afirmações, no Projeto... e em outros textos da mesma época (Freud 1894, por exemplo) que permitem supor que Freud atribuísse uma natureza elétrica à quantidade; [...] Mas, em outras passagens, Freud parece trabalhar com uma concepção mais hidráulica da quantidade, valendo-se de uma linguagem que está mais próxima, pelo menos metaforicamente, da mecânica dos fluidos, de modo que a questão permanece indecidida.”.


Referências:

in GARCIA-ROZA, A. Freud e o Inconsciente. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001, pags 43-60.

CAROPRESO, F.; SIMANKE, R. T.. O conceito de consciência no Projeto de uma Psicologia de Freud e suas implicações metapsicológicas (2005.) Disponível em http://www.scielo.br/pdf/trans/v28n1/29408.pdf.




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