Resenha – A cientista que curou seu próprio cérebro
Psicologia

Resenha – A cientista que curou seu próprio cérebro


Este livro e sua autora ficaram muito famosos; ele foi um sucesso de vendas e ela, Jill Bolte Taylor, foi considerada uma das 100 pessoas mais influentes do mundo em 2008. No original, o título é “My stroke of insight: a brain scientist´s personal journey”. Em português, houve um apelo maior de propaganda, e o subtítulo é “O relato da neurocientista que viu a morte de perto, reprogramou sua mente e ensina o que você também pode fazer”.

                A história, por si só, é bastante atraente. Uma neurocientista que foi vítima de um derrame aos 37 anos, que prejudicou grande parte do seu hemisfério cerebral esquerdo, incluindo a área da linguagem, e que ao longo dos anos conseguiu se recuperar plenamente. Sua visão sobre o que aconteceu, incluindo o dia do derrame e a sua recuperação, são bastante únicos por ser uma especialista no assunto.

                Logo na Introdução a autora recomenda que se leia primeiro os capítulos 19 e 20, com lições básicas sobre as funções cerebrais, para que seu relato seja mais compreendido pelo público leigo. Como ela mesma previu, grande parte das pessoas não consegue fazer isso e já começa a ler a história, e não fiz diferente, até porque já tenho conhecimentos básico em neurociências.

                Os três primeiros capítulos, sobre a vida dela antes do derrame, o dia do derrame e o pedido de socorro são muito envolventes. Fui sugada pelo relato e me envolvi com a história, ficando bastante apreensiva ao longo da leitura. Creio que alguém que tenha algum conhecido que sofreu um derrame vá se identificar bastante com a história narrada por Jill.

                A intensidade da empolgação dos primeiros capítulos não continuou nos outros, pelo menos para mim. Considero que a autora tenha narrado sua recuperação de um modo confuso, o que não permite o acompanhamento linear e progressivo; fica difícil saber que parte que ela recuperou primeiro e como, e quais depois. Enfim, ela misturou muitos momentos, é possível que para ela a descrição e ordem dos eventos estivesse clara, mas para o leitor não. Talvez para que a parte da recuperação fosse melhor compreendida, um livro bem maior fosse necessário.

                O livro é voltado para o grande público, no sentido de auto-ajuda, e não focado na autobiografia. Com o propósito de vender mais, cortou partes muito interessantes, pelo menos para mim, mas que talvez não fosse cativar muita gente. Por isso, acabou passando muito rapidamente pela parte da recuperação, e gastou muitas páginas para falar como uma pessoa comum pode ser mais hemisfério direito do cérebro (mais criativo, despreocupado, feliz etc.) do que hemisfério esquerdo (mais centrado, focado em detalhes, objetivo etc.).

                Mesmo no sentido de autoajuda, creio que o livro é fraco. As dicas que da autora para darmos mais espaço para o hemisfério direito em nossas vidas são senso-comum: meditar, rezar, cantar, sorrir, não julgar os outros, aproveitar o tempo presente, perdoar, ter compaixão... O marketing do livro é falar coisas óbvias, que todos sabem, pela boca de uma neurocientista. Como neurociência virou a nova febre, e parece conter toda a verdade das coisas, o livro parece trazer grandes revelações - o que não corresponde ao que li.

                Nos últimos capítulos, me reconciliei um pouco com o livro. A autora fala de neurociência, do funcionamento do cérebro, em palavras simples, fáceis de serem compreendidas, enfim, informações bem básicas mas interessante para leigos. Gostei mais das dicas que ofereceu sobre como lidar com uma pessoa em recuperação de um derrame, para uma família que esteja com um ente nessa situação, considero leitura essencial, e embora pudesse ser muito mais completa, é melhor do que nada.

                O livro não é ruim, mas para mim foi fraco pela falta de foco em um público específico. Tentou mirar em público geral para aumentar as vendas, nisso acabou ficando muito simples para pessoas que querem saber mais sobre derrame, e muito senso comum para os que estavam atrás da autoajuda. Creio que se a autora tivesse focado em sua autobiografia, com mais detalhes de sua recuperação, seria muito mais rico em informações. Porém, nesse caso, atrairia um público menor, possivelmente de pessoas que querem saber mais sobre derrames (próprios pacientes, familiares, amigos).

                De qualquer forma, como fiz psicologia e tenho conhecimento sobre neurociência, talvez para mim o livro tenha soado superficial, mas não para um leigo no assunto. Achei o subtítulo completamente apelativo, não vi nada sobre como “reprogramar” a mente, sem ser o que todos já sabem por conhecimento popular. Acho que a autora também peca em exagerar na neurociência, como se falar toda hora em neurônios, sinapses, hemisférios cerebrais provesse legitimidade a todas as experiências humanas. Mas essa é outra discussão.

                Taylor, J.B. (2008). A cientista que curou seu próprio cérebro. Ediouro. 223 páginas. 



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